Friday, September 07, 2007

António Variações, barbeiro de profissão, músico por devoção.

Este homem foi provavelmente o meu primeiro amor musical. Um amor que se mantem devoto até hoje. Este homem foi (ou deverei dizer é?) um génio. Morto quatro anos antes de eu nascer, poucos anos depois de estar viva conheci-o não me lembro com exactidão como, lembro-me de estar com a minha mãe numa discoteca (que desapareceu pouco tempo depois de abrir) a tentar escolher uma k7 que fosse recente de alguma das bandas portuguesas preferidas da minha prima para lha enviar para a Holanda. Ora, sem me lembrar exactamente de todos os pormenores (mesmo porque era uma fedelhita muito pequenina) lembro-me do senhor nos estar a pôr as k7's num dos leitores e a dar-nos os head phones para as mãos e lembro-me de escutar o som que saía dos dele, Variações. Ao fim de tanta audição musical e tão variada, curiosa, quis ouvir o que o senhor ouvia e é claro que acabamos por sair de lá com uma k7 para a minha prima, e três para mim: António Variações, Santos e Pecadores e Delfins. Lembro-me perfeitamente de ir no Twingo da minha mãe para a escola primária a cantar António Variações e de até gostar de ficar presa na passagem de nível só para ouvir mais um bocadinho. É interessante não é? A "O Corpo é Que Paga" deve ter sido o meu primeiro amor, logo seguida da "É Pr'Amanhã", eram as que eu percebia melhor a letra talvez, lembro-me que adorava a parte das unhas na "O Corpo é Que Paga", eu roía as minhas bastante, então achava graça ao que ele dizia.

Fui crescendo, ouvindo com mais atenção as letras das músicas, fui ganhando cada vez mais respeito e admiração pelo senhor, e só lamento que ele não tenha ficado entre nós mais tempo para viver um pouquinho mais a sua vida musical. O que nos deixou não foi muito mas vale, definitivamente, muito a pena e é valiosíssimo.

Este homem excêntrico, de maneiras demasiado europeias para um Portugal tão pequenino, trabalhador, apaixonado, aventureiro e dedicado, fez de tudo nesta vida e percorreu muitos e muitos palmos de terra. Este espírito livre buscava sagazmente a plenitude, o equilíbrio interior, através da experiência, fosse ela dolorosa ou não, em tentativas incansáveis de testar os seus limites, que seriam, em último, os de toda a gente. Transgressor, ousado, irreverente, abriu em Portugal o primeiro cabeleireiro unisexo de Lisboa, onde começou a dar nas vistas pela sua forma vanguardista de vestir. Este foi um homem privilegiado que via para além do seu tempo.


O homem que estava além, sempre insatisfeito e ansioso sobre o quê e quem vinha a seguir, não permitiu nunca que os seus dias passassem de forma sempre igual, tendo finalmente decidido retornar a Portugal e transmitir a sua filosofia de vida ao resto do seu povo, numa tentativa de dar e receber, sem nada ganhar e nada perder. Esta sua forma de encarar a vida e de escrever as suas músicas, sempre assentes sobre a sua larga vivência, pode não ter sido imediatamente compreendida por todos, mas assim quis o destino que a sua música perdurasse, fosse mantida e cuidada por sangue antigo e novo, de quem desde o primeiro momento compreendeu e apreciou em pleno a sua arte e mensagem, para que agora, todos nós, mais de 20 anos depois do seu desaparecimento o possamos fazer também.

Poderia algum outro nome assentar tão bem neste homem quanto Variações? Humilde, verdadeiro e original este homem é uma figura incontornável do panorama cultural português. Para o próprio a sua música caminhava algures por entre a Sé de Braga e Nova Iorque, reuniu o folclore, os sons cosmopolitas do rock, o pop, os blues e o fado, enlaçou-os na sua voz e cantou-os tal e qual como brotavam de dentro de si. Foi já, no hospital, nos últimos tempos da sua vida que ouviu pela primeira e última vez uma música sua na rádio.



"Tenho pena de morrer, mas não medo. Tudo o que acaba me deprime. Mais pelo fim do que pelo acto em si." - António Variações, poucas semanas antes de morrer.




É Pra Amanhã:



Canção de Engate:



Homenagens que valem a pena ouvir:

Toranja:



E não é que até o FF lhe fez uma homenagem num dos seus concertos?




E os Humanos? Maravilhosos. Ah grande Camané!!








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1 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Um ícone da musica portuguesa sem duvida.

*respeito e admiração*

Foi um espirito muito á frente para a mentalidade nacional do seu tempo de vida, e em alguns casos, mesmo de hoje em dia!


Paz á sua alma.

4:45 PM  

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